Já era noite escura há algum tempo. Tempo suficiente para serem horas de ir para a cama.
Mas estar à
janela era muito mais apetecível.
Maria, era
uma criança cheia de vida. Plena de imaginação, que muitas vezes os adultos, os
de casa e os de fora, não entendiam, e ela por sua vez, não os percebia a eles.
Eram complicados demais.
Por isso,
ali estava ela, sozinha na janela a espreitar as nuvens que conseguia ver
passar em frente da lua, e imaginar nas formas que via, animais que conhecia,
ou então não conhecendo, achava que podia talvez terem aquela forma e serem
daquela assim, como os estava a idealizar.
Numa outra
ocasião, podiam ser objectos, aquele que mais se assemelhasse ao que os seus
olhos viam passar. Por vezes mudava de ideias, e o que lhe tinha parecido um
globo passou a ser um relógio gigante que ganhou um pêndulo, e dava horas a
todas as horas. A sua imaginação era infindável.
Deu um longo
suspiro, mudando de posição no banco. As pernas já estavam dormentes.
- O melhor
que tens a fazer, é ir para acama. Se te virares ao contrário, vês a janela e o
céu.
Por
instantes ficou parada. Depois começou a olhar, devagar, em volta, para
descobrir quem tinha falado.
Sobre um
banco pequeno redondo que lhe servia de mesa de cabeceira, estava poisada uma
luzinha que provinha, percebeu quando se aproximou, de um pequeno homem de
olhos brilhantes, mãos cruzadas em frente da barriga. Estava sentado, muito
confortavelmente num dos seus brinquedos de madeira. Tinha uma roupa estranha
vestida, antiga, parecendo feita de retalhos de muitas coisas. Por chapéu,
tinha o pé de uma bolota, sendo este pequeno para o seu cabelo ruivo, espetado
para todo o lado.
Era uma
figura e tanto, resolveu a Maria, gostando logo dele.
– Olá, eu
sou a Maria. – disse a Maria, tomando coragem.
- Bem sei.
Conheço-te muito bem, e de há muito tempo. Eu sou o gnomo Vaga Lume.
- Vaga Lume?
Nunca tinha ouvido esse nome. – Maria sentia-se um pouco atarantada, algo que
não era normal nela.
- É claro
que não tinhas ouvido. Ele só me foi dado a mim. – respondeu o Vaga Lume, algo
abespinhado – Isto é porque quando perco a calma, por vezes, não muitas, mas às
vezes, pego fogo àquilo que me irritou, estás a entender? Não faço por ter mau
temperamento, é uma questão de feitio!
- Entendo.
Quando te irritam ou dizem coisas más.
- Ora até
que enfim, alguém que me entende! Será que foi por isso que os anciãos me
disseram para te vir fazer companhia? Humm! Também me disseram para olhar para
o teu coração e aprender. Humm! Tenho feito tudo isso durante o tempo que te
tenho estado a observar sem me mostrar… Humm! Tenho de pensar nisto…
Maria, ouvia
o discurso do gnomo de olhos esbugalhados.
- Não seria,
talvez, por eu ter desejado muito um companheiro, alguém com quem conversar ou
até brincar?
A esperança
brilhava nos olhos da pequena enquanto confessava aquilo que mais desejava.
Vaga Lume,
levantou-se, deu uma volta com as mãos na cintura, e olhou de lado para a
Maria.
- Ai foi?
Desejaste muito um companheiro? Aqui em casa não tens quem brinque contigo, não
é?
- Já são
todos grandes. Não têm tempo para mim, e a mãe, quando pode e não está muito
cansada, conta-me uma história…
- Eu posso
ser teu amigo! Sou um amigo dos bons. E fica a ser um segredo só nosso. Que me
dizes?
- Digo-te
que também sou uma amiga das boas, e que o segredo está guardado.
Maria, fez o
sorriso mais feliz da vida, que foi retribuído pelo Vaga Lume
Dois amigos,
uma criança e um gnomo – real, ou não! – que se tornaram companheiros para a
vida, ela tendo companhia quando a solidão apertava, e ele, aprendendo a domar
o seu feitio.
Anita dos
Santos

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