quarta-feira, 30 de setembro de 2020
(II) - Aguenta a pressão, miúdo / PAULO LANDECK
segunda-feira, 28 de setembro de 2020
OS SONHADORES E AS ESTRELAS, de Anita dos Santos
Como sempre,
combinaram encontrar-se na noite sem lua.
Era a melhor
altura. Além disso, como havia pouca luz ninguém andava a passear. Havia poucos
que gostassem do escuro. Tirando as corujas, claro.
Cada um vinha
de seu lado pois moravam em sítios diferentes. Tinham começado a juntar-se aos
poucos, quase sem darem conta. Depois foi uma questão de se habituarem a estar
juntos, a conversar, a olhar para o alto.
Naquele dia
o primeiro a aparecer foi o Urso. Não costumava ser o primeiro pois morava
longe, mas naquele dia adiantou-se e deixou-se ficar escondido por entre os
arbustos, imóvel e indistinto no meio das sombras.
Daí a pouco
ouviu restolhar e olhou para a direita vendo surgir o rosto do Texugo rente ao
chão.
Este, como
não estava a contar com a presença do Urso, apanhou um tremendo susto,
arregalando os olhos no meio da cara listada, fazendo uma expressão cómica.
- Já cá
estás?
- Pois não
me estás a ver?
- Não sei
como não caí para o lado…
- Para a
próxima, tenta fazer menos barulho. Ouvi-te à distância!
O Texugo,
arrebitou o nariz e sentou-se confortavelmente a aguardar pelos outros.
De repente,
surgido como que do ar, apareceu o Rato! Era a sua imagem de marca, aparecer
sem ninguém dar por ele!
- Mas tu…
Como é que fazes sempre isso? – Perguntou o Texugo com ar indignado, pois por
mais que tentasse não conseguia imitar o Rato.
- Segredos,
meu amigo, segredos que não se podem contar a ninguém! – Respondeu o Rato com
expressão ufana.
- Como
sempre temos de esperar por ela…
Palavras não
eram ditas, e eis que de um salto surge no meio deles a Lebre.
- Chamaram?
Estava só à espera da minha deixa para aparecer!
- Muito bem,
já que estamos todos, vamos lá que a noite não dura sempre.
Dirigiram-se
para a clareira do bosque que era cercada por árvores centenárias de tamanho
que nem conseguiam calcular. No meio da clareira havia uma pedra alta e esguia
junto da qual se sentaram, de costas bem encostadas e olhos virados para o céu.
- O ar hoje
está limpo e brilhante. – Diz o Urso.
- Cheira a
erva verde e tenra. – A Lebre franze o nariz a cheirar o ar.
- Hoje vamos
ver bem os brilhos lá em cima. – A voz do Rato soa reverente.
- Sim,
vamos. Lá está a Grande Toca de Esconder com o seu caminho bem marcado. Será que
é hoje que vemos alguma das outras luzes dar com ela? – Pergunta o Texugo para
ninguém em particular.
- Pode ser.
Elas têm o caminho bem marcado com outras brilhantes, e mais outra em cada
canto. Tenho de confessar que não entendo porque é que ainda nenhuma lá entrou.
A voz do
Urso soava baixa, e espelhava a confusão dos companheiros.
Ora as
brilhantes tinham o caminha para a Grande Toca de Esconder tão bem marcado…
E havia
tantas brilhantes lá em cima… será que não tinha de se esconder?
- Só pode
ser isso. Não têm de se esconder… Já pensaram, não precisar de uma toca de
esconder? – O Rato, ponderava nesta suposição descabida.
- Então para
que têm lá a Grande Toca de Esconder? Ali, tão bem feita uma brilhante em cada
canto e mais quatro brilhantes a indicar o caminho, sendo a última a mais
brilhante de todas? – Perguntou a Lebre, agastada.
- Não sei.
Lembram-se quando fizemos uma Toca de Esconder com pedras igual à Grande Toca
de Esconder, não escondia lá grande coisa…
- Só fica
escondido quando é dia.
Ficaram
todos a ponderar naquela questão durante algum tempo de olhos postos naquela
enorme Abobada Escura pontilhada por uma enormidade de brilhantes.
O Rato, de
repente, dá um salto de nariz no ar, como quem não acredita naquilo que está a
ver. De imediato todos voltam os olhos para onde o Rato estava a olhar e,
espanto dos espantos, vêem umas quantas brilhantes a fugir pela Abobada Escura,
deixando atrás de cada uma um rasto brilhante que a pouco e pouco se vai
desvanecendo.
Aquelas
poucas brilhantes desapareceram rapidamente.
- Viram?
Viram? Mas porque não foram elas para a Toca de Esconder?
De súbito
surgiu um novo grupo, maior, mais brilhante. Deste grupo destacou-se uma das
brilhantes, que ganhou velocidade, indo desaparecer mesmo no centro da Toca de
Esconder.
As
respirações que tinham ficado em suspenso, fizeram-se ouvir em alívio.
Salvou-se uma!
Olharam para
todos os lados em busca de outras que pudessem aparecer. E assim foi.
Em grupos ou
isoladas, as brilhantes fugiam a grande velocidade de uma ponta a outra da
Abobada Escura, só mais duas conseguindo dar com a Toca de Esconder.
- Mas como é
possível?
- E de que
fogem elas?
- Estão
completamente cegas…
Só o Urso se
manteve caldo, de olhos levantados, concentrado em tudo o que estava a ocorrer
lá no alto.
Por fim já
não havia mais brilhantes a correr pela imensidão escura.
- Três. Só
três…
De súbito,
apareceu uma pequenina brilhante vinda da cauda da Toca de Esconder,
percorrendo o caminho até a mesma e desaparecendo dentro dela num dos seus cantos.
Ouviu-se um
suspiro colectivo.
- A Ursa,
minha mãe, tinha uma toca de esconder onde nós, as crias, nos escondíamos
quando ouvíamos ou cheirávamos alguma coisa. Era assim, tinha um caminho e uma
entrada. Depois de lá estarmos dentro, ela colocava-se a tapar a entrada. Nada
ali passava.
Ficaram
todos a olhar por momentos para o alto. Por fim o Texugo disse:
- Talvez
devêssemos chamar Grande Ursa à Toca de Esconder…
A Lebre
mirou o Urso de lado, e repontou:
- Ursa
Maior, acho que lhe fica melhor.
- O que é
certo é que aqueles quatro pequenos ficaram seguros, essa é que é essa!
- Ursa
Maior, parece-me bem!
E assim foi
que os quatro amigos continuaram a juntar-se para ver a Ursa Maior!
domingo, 27 de setembro de 2020
sábado, 26 de setembro de 2020
O SEXTO SENTIDO, de Fernando Teixeira
Pagou a conta e saiu dali. Fez o caminho inverso até à zona de estacionamento onde tinha deixado a mota. Quando chegou, abeirou-se do guarda-corpos de cimento que protegia os peões do declive para a praia. Inspirou o ar marítimo a plenos pulmões e, quando estava prestes a virar costas ao oceano, os seus olhos pararam em dois vultos, ao longe, na extremidade sudeste da praia: do adulto, não estava certo, tinha a cabeça coberta por um capuz do que parecia ser um anorak azul-claro; já do cão bege que pululava em redor, podia quase assegurar tratar-se de um Golden Retriever.
Sentiu um sobressalto. Seria a francesa cujo pensamento o levara nessa manhã, de forma no mínimo ingénua, a deslocar-se até Le Pouldu, numa mais que provável vã tentativa de a reencontrar por acaso?
Não se iria embora sem saber. O seu gatinho teria de esperar mais algum tempo por companhia! Desceu um pequeno carreiro que levava à praia. Com tantas algas secas e outros resíduos vegetais ásperos na areia, ajuizou ser melhor não se descalçar. Aproximou-se lentamente e as dúvidas iam-se dissipando, ou talvez devesse dizer que a esperança ia aumentando. A uns vinte passos, um pé-de-vento fez soltar o capuz quando a pessoa se virou para o mar, descobrindo-lhe o cabelo grisalho encaracolado, e foi então que teve a certeza de que era mesmo ela, embora se encontrasse de perfil.
Surpreendentemente, nesse preciso momento, o cão disparou direito a ele, o que fez com que a francesa virasse a cabeça na sua direcção. Só o reconheceu quando Pedro se acercou e lhe estendeu a mão para a cumprimentar.
– Olá, boa tarde! Como vai? Pelos vistos, o Doëlan ainda se lembra de mim… – disse, afagando a cabeça do Retriever que, depois de o cheirar, tinha colocado as patas da frente à altura da sua cintura e abanava a cauda freneticamente.
Ela devolveu o cumprimento com uma expressão que espelhava curiosidade.
– É um animal muito inteligente e dócil! Não esperava vê-lo por aqui, agora… Desculpe, no outro dia saí um pouco à pressa!
– Não tem de que pedir desculpa! Compreendo que o Doëlan quisesse desaparecer da vista do veterinário o mais depressa possível…
Ela riu-se, manifestando agrado por ele ainda se lembrar do nome do seu animal de estimação.
– Dificilmente me esqueceria, eu estou a residir em Port de Doëlan.
– A sério? Ah, bom! Pensei que morasse aqui em Le Pouldu.
– Não, só vim cá com o meu gato ao veterinário.
– Sim, o Biscaya… com “y”! – exclamou a francesa, erguendo o indicador no ar, ao nível da face, e rematando num tom que acentuava a importância do pormenor.
– Isso! – devolveu ele, sorrindo com a sua atitude e, principalmente, sensibilizado por ela se lembrar, e por ter frisado o detalhe da forma que se recordava de ter proferido na clínica, à laia de imitação, como se isso revelasse um gesto de cumplicidade muito próprio. – Já que estamos a falar de nomes: Pedro.
Estendeu-lhe a mão de novo, como se um novo cumprimento fosse requerido para tornar a apresentação tão formal quanto deveria ter sido pela primeira vez.
– Sylvie – retorquiu ela, não se negando a um segundo aperto de mão e fazendo um gesto teatral. – Mas o seu sotaque é…
– Português. Sou português!
– Fala um Francês bastante fluente! – opinou, com visível agrado. – Como veio parar à Bretanha?
– É uma longa história… – respondeu, evasivo.
– Desculpe, na verdade é ousadia minha esperar que partilhe a sua vida privada com uma estranha!
– Não tem de que se desculpar! – disse, de novo. – Estranha, chega a ser a minha vida, até para mim…
Sylvie não respondeu. Notara que havia pisado uma linha que não devia ultrapassar. O seu sexto sentido percebera uma sombra cinzenta no olhar vago daquele homem, sombra que não era o reflexo do céu nublado nos seus olhos. Seria algo profundo, íntimo… O que quereria ele dizer com vida estranha?
in Traços De Pont-Aven
(O autor escreve segundo a ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.)
sexta-feira, 25 de setembro de 2020
Os Nove Braços do Hanukiah de Rita Mayer Jardim / CASA DAS LETRAS
Um candelabro judaico desaparece do museu da
sinagoga de Savannah, no estado norte-americano da Geórgia, e uma estranha
mensagem em português é deixada no seu lugar. Suspeita do furto, a genealogista
Clara Mendes cruza-se então com Lior, um veterano de poucas palavras que se
dedica a investigar o paradeiro de artefactos judaicos roubados e que lhe pede
para ir a Israel pesquisar a sua descendência de uma ilustre família sefardita.
Ingénua, mas determinada, Clara depressa se vê
envolvida numa intriga empolgante que a leva a mergulhar na história conturbada
do povo judeu, tanto na Europa como no Novo Mundo, e que tão depressa a faz
recuar ao terror da Inquisição como a descobrir os meandros da nova
extrema-direita internacional.
Decorrendo ao longo de vários séculos, por entre
os segredos das ruas tortuosas de Jerusalém e a dura colonização do sul dos
Estados Unidos da América, a diáspora judaica de Marrocos e as profundezas da
Amazónia brasileira, Os Nove
Braços do Hanukiah é um romance apaixonante à volta
do extenso legado dos judeus sefarditas, um povo que, certo dia, Portugal
decidiu expulsar.
quinta-feira, 24 de setembro de 2020
ANTÓNIO, de Maria Cecília Garcia
A Vida Secreta da Cozinha Portuguesa de Guida Cândido / DOM QUIXOTE
quarta-feira, 23 de setembro de 2020
(I) - Corria o ano de 2005, sentia-me confiante, pujante, rejuvenescido. / PAULO LANDECK
terça-feira, 22 de setembro de 2020
segunda-feira, 21 de setembro de 2020
sexta-feira, 18 de setembro de 2020
Viajo Sozinha de Samuel Bjork / DOM QUIXOTE - Tradução de Eurico Monchique
Quando
o cadáver de uma menina é encontrado pendurado numa árvore, a única pista que a
polícia tem é uma nota pendurada no pescoço dela onde se lia: Viajo sozinha.
O
detetive Holger Munch é encarregado de reunir uma unidade especial de
homicídios. Mas para completar a equipa ele tem de encontrar a sua antiga
parceira, Mia Krüger – uma investigadora brilhante mas problemática –, que se
retirou para uma ilha isolada.
Ao
rever o processo, Mia descobre algo – uma fina linha raspada numa unha de um
dedo da menina: o número um. Isto é apenas o início. Para salvar outras
crianças de um destino semelhante, ela terá que encontrar uma maneira de
afastar os seus próprios demónios e impedir que este criminoso se transforme
num assassino em série.
quinta-feira, 17 de setembro de 2020
quarta-feira, 16 de setembro de 2020
Por carreirões e estradas (des)calçadas / PAULO LANDECK
terça-feira, 15 de setembro de 2020
A Faca de Jo Nesbo / DOM QUIXOTE - Tradução de C.S.C. Marques
Harry Hole está em maus
lençóis. Rakel, a única mulher que algum dia amou, deixou-o de vez. A Polícia
de Oslo ofereceu-lhe uma nova oportunidade, mas para resolver casos menores,
quando na realidade o que ele pretendia era investigar Svein Finne, o violador
e assassino em série que, em tempos, pusera atrás das grades. E agora, Finne
está livre depois de mais de uma década na prisão, e Harry determinado a
investigar todas as suspeitas que continuam a recair sobre ele.
Mas nada lhe corre como
gostaria e a cada dia que passa só vê piorar a sua situação. Quando, depois de
uma noite de embriaguez total, Harry acorda de manhã completamente desmemoriado
e com sangue nas mãos percebe que algo de estranho se passou. Porém, o que
nessa altura Harry ainda não sabe, é que acordou apenas para viver o pior
pesadelo de toda a sua vida.
segunda-feira, 14 de setembro de 2020
domingo, 13 de setembro de 2020
A MISSIVA, de Fernando Teixeira
Enquanto percorria a estrada de óptimo piso para Le Pouldu, por entre campos verdejantes, largos e planos, salpicados por casas brancas de telhado negro, a baixa velocidade por causa do seu passageiro de quatro patas, ia congeminando algumas ideias que repetidamente assolavam à sua mente, sem que tivesse ainda chegado a uma conclusão.
Uma das questões que mais o intrigava era saber até que ponto a pista Clohars-Carnoët lhe dava alguma indicação segura do paradeiro do seu filho, que cortara relações consigo havia duas décadas. A última vez que falara com ele, lembrava-se bem, sabia-o algures em Itália. Como podia esquecer? Recebera a chamada do filho, esperançoso de uma súbita reconciliação, na última tarde de três dias em que se deslocara a Lisboa para visitar a Expo98, a Exposição Internacional de Lisboa, subordinada ao tema “Os oceanos, um património para o futuro”.
– Presta atenção! Não quero que me voltes a ligar nem que voltes a chatear a mãe, ouviste bem? Esquece que nós existimos! A minha mãe não quer saber de ti para nada e eu também não! Para mim, tu morreste!
Não era o vento que fazia lacrimejar os seus olhos, protegidos pela viseira. Aquelas palavras continuavam a feri-lo, como no primeiro dia. Recordava que não tinha querido ver mais nada. Saíra do recinto da exposição com a voz e a mente embargadas e rumara de imediato ao Algarve, ainda hoje não sabia como tinha conseguido conduzir com os olhos numa cortina de água. Se os oceanos eram um património para o futuro, o seu parecia terminar naquele mar de lágrimas!
Revia imagens claras que o tempo não conseguia desvanecer: o momento em que abrira o envelope sem remetente pela primeira vez e dele retirara o cartão, duas linhas de palavras secas e um nome:
Talvez te interesse saber que a
minha mãe faleceu há três dias.
Afonso
Porquê aquela missiva do filho agora, anunciando a morte da mãe, fazia dois meses? Se nem Afonso, nem tão-pouco ela se haviam interessado por saber se ele estava bem, se continuava vivo, antes tinham manifestado vontade de que desaparecesse da vida deles, desaparecendo da sua, por que motivo o filho dera subitamente à costa, tanto tempo depois?
Raciocinou, como já o fizera de outras vezes, que Afonso não queria dar a conhecer o seu paradeiro ou teria, simplesmente, indicado um endereço de remetente. Ora, o facto de o filho nem sequer ter escrito o nome no envelope parecia indiciar que o clima de blackout se mantinha, não tendo qualquer interesse em estabelecer uma aproximação ao pai, para além de formalizar a informação que pretendia dar. E era isso que o confundia: que necessidade tinha Afonso que ele soubesse que a sua ex-mulher tinha morrido, quando tinham estado mais de vinte anos sem se verem e sem comunicarem? Para o filho, ele até estava morto!…
Por que se dera ao trabalho de o avisar? E, embora o teor da missiva fosse seco de sentimento, a verdade é que ele assinara a mensagem, como se acenasse e dissesse: Estou aqui!
in Traços de Pont-Aven
(O autor escreve segundo a ortografia anterior ao Acordo Ortográfico de 1990.)
sexta-feira, 11 de setembro de 2020
Alamedas Escuras de Ivan Búnin / DOM QUIXOTE - Tradução de Nina Guerra e Filipe Guerra
Escritos
entre 1938 e 1944, e ambientados no contexto das crises culturais e históricas
russas das décadas anteriores, estes contos centram-se em ligações obscuras e
eróticas. O amor – nas suas diversas e variadas formas – é o tema unificador
deste conjunto rico de narrativas, caracterizado pela prosa evocativa, elegíaca
e elegante pela qual Búnin ficou célebre.
Traduzido
pela primeira vez em Portugal diretamente do russo, por Nina Guerra e Filipe
Guerra, e na sua totalidade, Alamedas Escuras é uma das grandes conquistas da literatura russa émigré do século xx. Uma obra-prima que levou o
domínio poético da linguagem de Búnin a novos patamares e que é, ainda hoje, um
dos livros de contos mais lidos na Rússia.
quinta-feira, 10 de setembro de 2020
A Vida Brinca Comigo de David Grossman / DOM QUIXOTE - Tradução de Lúcia Liba Mucznik
Túvia
Bruck era o meu avô. Vera a minha avó. Rafael, Rafi, R., como é sabido é o meu
pai, e Nina… Nina não está cá. Nina não está. Foi sempre esse o seu contributo
especial para a família. E eu, o que sou?
Estas são algumas das observações que Guili, a
narradora de A Vida Brinca Comigo,
aponta no seu caderno. Mas, por ocasião da festa dos noventa anos de Vera, Nina
regressa: apanhou três aviões, que a trouxeram do Ártico até ao kibutz para se
reencontrar com a euforia da mãe, a raiva da filha, Guili, e a veneração
intacta de Rafi, o homem que, apesar de tudo, ainda perde todas as suas defesas
quando a vê. Desta vez, Nina não pretende fugir: ela quer que a mãe acabe por
contar o que aconteceu na Jugoslávia durante a «primeira parte» da sua vida,
quando, jovem judia croata, se apaixonou por Milosz, filho de camponeses
sérvios sem terra. Nina quer saber mais sobre o seu pai, Milosz, preso sob a
acusação de ser um espião estalinista. E porque é que Vera foi deportada para o
campo de reeducação na ilha de Goli Otok, abandonando-a quando tinha apenas
seis anos.
quarta-feira, 9 de setembro de 2020
Leiria Film Fest – “Altitude”, de Nicole Scherer / PAULO LANDECK
terça-feira, 8 de setembro de 2020
Quichotte de Salman Rushdie / DOM QUIXOTE - Tradução de J. Teixeira de Aguilar
Inspirado pelo
clássico de Cervantes, Sam DuChamp, um medíocre autor de livros de espionagem,
cria Quichotte, um cortês e apatetado vendedor ambulante obcecado pela
televisão, que é vítima de uma paixão impossível por uma estrela de TV.
Acompanhado pelo seu filho (imaginário) Sancho, Quichotte empreende uma
picaresca busca pela América a fim de se mostrar digno da mão da celebridade,
arrostando valorosamente com os tragicómicos perigos de uma era em que
«Tudo-Pode-Acontecer». Entretanto, o seu criador, que vive uma crise de
meia-idade, enfrenta igualmente os seus imperiosos desafios.
Tal como Cervantes
escreveu Dom Quixote para
satirizar a cultura do seu tempo, Rushdie transporta o leitor numa desvairada
corrida através de um país à beira do colapso moral e espiritual.
segunda-feira, 7 de setembro de 2020
domingo, 6 de setembro de 2020
Hoje, damos a boas vindas a Paulo Landeck, colaborador da Nova Gazeta.
Paulo Osório da Silva Landeck nasceu em 1978. Colabora com o jornal Nova Gazeta, faz parte do Conselho Científico da RAES – Revista de Ambiente, Ecologia e Sustentabilidade. Dizem ser ave de arribação, vagabundo do mar, amigo, boémio, eterno errante…por vezes asceta…tímido e extrovertido, paradoxo, hedonista, filho de Deus e do Diabo. Foi próximo do Moinho de Maré de Alhos Vedros (Moita) que fugiu pela primeira vez, do amparo de sua mãe. Cresceu no Vale da Amoreira, num irrequieto ambiente multicultural urbano da margem sul do Tejo, antes de se fazer ao cais para soltar amarras. Viveu e trabalhou em lugares que o marcaram de forma muito intensa, como: Portalegre, ilha da Madeira, Peniche, Londres (Chelsea, Brixton, e Earl’s Court), Newquay (Cornwall), País-de-Gales, Porto, Açores, Trás-os-Montes, Terra Nova, Noruega, Escócia, Figueira da Foz, São Pedro de Moel, Zadar (Croácia), Cartagena (Espanha), Faro, ou Lisboa.
Além da paixão pelo mar, dedica muito do seu tempo a questões ligadas à sustentabilidade; defende maior atenção aos serviços de ecossistemas; acredita na economia da conservação; mergulha diariamente na cultura; advoga que o Ecoturismo, pode ser importante ferramenta para a valorização e conservação patrimonial, por via de um cuidado planeamento orientado para os aspectos diferenciadores que possam ser valorizados de forma verdadeiramente sustentável, em cada região.
Desde miúdo, já sonhou ser: arquitecto, entomólogo, sociólogo, arqueólogo, escritor e viajante, botânico, jornalista, professor, sonhador profissional. Tem uma estranha fobia a palhaços (Henry Miller deu-lhe estranhos pesadelos, quando conheceu o palhaço Augusto em, 'O Sorriso aos Pés da Escada'); é um pouco hipocondríaco, o que dificulta, ou talvez não, o cumprimento de regras, em plena pandemia. É observador de espécies marinhas, marinheiro, guia, ser humano incompleto e insatisfeito; foi admitido para o Curso de Oficiais do Exército (teve curta passagem pelos Comandos); conta com diversificada experiência profissional; andou às voltas, debaixo e à tona de água (em lazer, e em trabalho). Tem longa experiência de trabalho em contexto científico, sobretudo na área da biologia marinha e pescas, e no turismo.
Trabalhou em escolas de surf e de mergulho, hotelaria, aviação; foi professor, guia turístico, gestor de conteúdos…é freelancer dedicado; fotógrafo amador, está sempre disponível para novas aventuras que o levem à descoberta. Defende o turismo sustentável e abomina a forma como o turismo de massas continua a imperar, contrariando toda e qualquer lógica dos desafios com que somos confrontados, em pleno século XXI. É um guia de natureza apaixonado pelo mundo que o rodeia.
Formou-se em Turismo (licenciatura pré-Bolonha), no Instituto Politécnico de Portalegre. Concluiu pós-graduação em Ecoturismo, pela Escola Superior Agrária de Coimbra. Mestrando com estágio/dissertação por terminar, na mesma área. Paulo, conta com diferentes cursos profissionais reconhecidos internacionalmente; tem formação profissional em produção multimédia pela ETIC; cursos de mergulho CMAS/PADI; carta de Patrão Local; cédula marítima…fez diversos cursos avançados de segurança e sobrevivência no mar, em Portugal e no estrangeiro. Foi bolseiro científico, tendo colaborado sobretudo com o Departamento de oceanografia e Pescas (DOP) da Universidade dos Açores, e com a Universidade do Minho/Sociedade Portuguesa de Vida Selvagem (SPVS). Foi Observador de Pescas da U.E. Passou pelos escuteiros, dedicou-se a causas ambientais como voluntário, desde aves marinhas (longe de sonhar que um dia haveria de colaborar nos trabalhos para a criação de um Atlas das Aves Marinhas de Portugal), ao apoio em trabalhos para a preservação do burro mirandês; fez parte do Grupo Académico de Serenatas de Portalegre, terra onde teve também longo percurso associativo, enquanto dirigente académico; esteve ligado a diversas organizações ambientais, como associado e/ou voluntário - colaborou com diferentes escolas da Grande Lisboa (voluntário a título particular) em acções de sensibilização e educação ambiental. Iniciou-se ao mergulho amador nos anos 90 (CMAS/PADI), vive o surf como filosofia de vida, gosta de pescar, adora o contacto coma a natureza, e de desportos radicais.
Para ele, navegar é embalar, resistir, e viver em liberdade! Praticou artes marciais e luta-livre olímpica; partiu um dente a dropar um halfpipe de skate, numa aposta no Marés Vivas em Vila Nova de Gaia, durante um concerto de Jon Spencer, Blues Explosion…saiu-se bem melhor com os patins, ainda que numa vertente de street agressiva, pelas ruas da Grande Lisboa; adora caminhar, pedalar, estar dentro de água, de toda a forma e feitio.
Desde cedo, tomou gosto às viagens dentro e fora de portas, marcou-o muito uma de suas primeiras saídas em que se perdeu na catedral de Santiago de Compostela, era ainda uma criança; quando a Guardia Civil o veio devolver aos pais, uns dias depois, decidiu que queria ser errante, para jamais se voltar a perder. Na sua primeira ida à Noruega (por Oslo e arredores), deixou amigos e amores. Em território luso, o surf e a montanha, deram mote a várias escapadelas de toda a forma e feitio.
Fez várias incursões de mochila às costas, por terras perdidas de Portugal e Espanha, atraído pela relação da terra com as suas gentes, ser backpacker está-lhe no sangue, há quem diga que o verdadeiro Paulo Landeck poderá ter sido trocado por um cigano, ainda na maternidade. Tomou gosto à road trip, numa primeira viagem, em que do Alentejo rumou ao País Basco, tendo depois atravessado a França rumo a Calais. Tinha Londres, como ponto de viragem para o regresso, mas resolveu ficar a viver em Chelsea. “Tornou viagem”, alguns longos meses depois, andou pelos Países Baixos, Luxemburgo, e atravessou calmamente França, numa procura de um cenário mais rural.
Apesar do seu particular gosto por lugares perdidos e achados, gosta de seguir uma via epicurista de estar no mundo, sendo a facilidade de adaptação, umas de suas imagens de marca (talvez lhe esteja no sangue e nas múltiplas heranças genéticas, como revelam os traços estampados no seu rosto…é difícil definir a que país pertence, só pela fisionomia). Correu muitos dos destinos mais populares de Espanha e parte do seu lado mais escondido; teve o prazer de calcorrear quase todos os municípios de Portugal; conheceu lugares que eram tão periféricos há décadas atrás, como Câmara de Lobos (Madeira), ou Rabo de Peixe (Açores), em difícil “contexto de uma época”…teve o privilégio de ir às Formigas (em trabalho), entre outros lugares recônditos de sua alma. Ao longo de 16 anos, passou meses e meses seguidos embarcado, sobretudo: na pesca do bacalhau da Terra Nova; nos Açores, ao caranguejo-das-funduras; no palangre ao espada-preto, e na pesca tradicional à linha, ao atum; na costa continental portuguesa (pesca costeira, e a velejar); nos mares Mediterrâneo e Adriático; nas Ilhas Shetland (Escócia), Inglaterra, Países Baixos, e plataforma continental norueguesa do Mar do Norte…navegar, ontem, hoje, e sempre que possível!
Foram longas, as veraneantes temporadas, entre Vila Viçosa e Elvas, onde admirava a biblioteca de seu avô transmontano que escolhera o Alentejo, depois de páginas e páginas viradas em África, a mesma que lhe dera a sua avó materna. Ali podia deixar fluir vagarosamente, cada dia de sol. Teve uma adolescência marcada pela cultura do surf da Costa da Caparica, onde se refugiava à procura de azul e emoções fortes que os desportos radicais oferecem; ficava sempre em casa de uma tia, quando podia, pois ali sentia uma outra vida, mais tranquila, entre cada grão de areia que se escapava entre mãos ao folhear um bom livro na praia…ali viveu paixões de adolescente, e outras maresias, num quadro pintado pela xávega, e pelo brilho prateado de vivas escamas.
As férias grandes são, ainda hoje, para ele, sinónimo de mágicas temporadas passadas entre Vila Nova de Gaia e Porto, em casa de familiares (foram tão bons os episódios: das piscinas da Granja e sobretudo a de Espinho, das surfadas dali ao Paredão, pela Sereia, essa Madalena nunca revoltosa, nunca arrependida (e que bons restaurantes!), que vagalhões, nas “marés vivas”! Da memória nunca fugirá, o litoral da Aguda, ou mais pelo interior, o inebriante cheiro a mata, entre fetos que pareciam tão gigantescos quanto o olhar das crianças; os tanques das lavandeiras, caminhadas mil entre Valadares e Miramar, antenas ao Monte da Virgem, frutos no pomar, galos gigantes, lenha e sabores, do Cais da Pedra ao Douro, Porto de passagem, de abrigo…romântico…ali faz-se das tripas o sal, e das lágrimas do mundo, o coração que resiste ao tempo, em barricas que sobem e descem em rabelos, numa luta que se venceu…desigual; a água corria-lhe também na boca, quando sentia o cheiro das sardinhas, em Matosinhos, ou dos incontáveis petiscos nas casas típicas da região; quer a norte, quer a sul, parecia-lhe no entanto ser outra dureza, a tal, que resiste ao mar, como o Senhor da Pedra apregoa: a rocha irrompe mar adentro, lembrando cavalos de outros tempos…. Seria impossível como marinheiro, não ter ficado para sempre marcado pela contagiante energia do Pico; há para ele lugares que ultrapassam qualquer frame, assim é nos Açores, como nos fiordes de Bergen, no Alto Douro Vinhateiro, ou na luminosidade da Ria de Aveiro! Sabe que a sua Portalegre amada encerra saborosos e íntimos segredos; ao planalto transmontano quer também voltar, pois só quem não conhece, não imagina, como tão bem se pode estar por lá; Coimbra conquistou-o, como quem faz a corte, hoje está rendido. Repetidas foram as suas fugas ao Verde Minho, onde no Gerês procurou carregar baterias, e com sucesso! Peniche poderia bem ser um local de eleição para viver, pela tribo do surf, e boas memórias do melhor tempo do Baleal. Teve a sorte de viajar no tempo e memória, por St. John’s, no Canadá; espreitar ravinas e penhascos, onde quer que os encontrasse; sonha cruzar mundo qual garajau; já se pendurou nas asas de “pombaletes”, em dias de tempestade; focou alcaides e pardelas; seguiu vezes sem conta, o vôo picado do mascate; os araus e tordas-mergulhadeiras; nadou com golfinhos em alto mar, emocionou-se a cada encontro com os gigantes gentis, para ele, viver experiências com cetáceos, é como manter sonhos e chama de criança, sempre vivos…com esperança. Não menos interessante é o mundo dos peixes, ou dos répteis…enfim…fosse um ser marinho, e não saberia qual gostaria de ser; talvez seja o desconhecido, aliado ao conhecimento empírico, e ao gosto pela aventura, o que mais o move. Redescobriu os sentidos por via de paisagens mais complexas, que os diferentes cheiros do oceano, texturas, tormentas, e sonhos nos proporcionam. É também na sua Arrábida, a da fenda (onde escalava em miúdo), das desproporcionais feridas abertas, onde melhor se sente em casa, quando por Setúbal, sobretudo de Inverno, longe do caos dos tempos que correm. Esse seu abrigo, estende-se também às marinhas de sal e sapais existentes no Tejo, onde tanto tempo passou, e passa, e que melhor sorte merecia, num país que pode e deve gerir melhor, o que é tão importante, até para a qualidade de vida, de todos.
Quanto ao mar, sabe que teve um antepassado cozinheiro de origem madeirense em navios de longo curso, e um escafandrista que provavelmente terá vivido emocionantes aventuras…restam heranças de traços passados a régua e esquadro, de olhos postos no mar; e viagens dos tempos do Ultramar, que escutou em criança.
Trisneto
de prussiano de origem polaca, membro da Comuna de Paris (1871), está-lhe na
guelra, uma certa inquietação; é bisneto de arquitecto inglês que deixou obra
de influência veraneante francesa em Portugal…herdou das gerações seguintes, os
ecos de África. Seu pai nasceu no Lobito, e combateu na Guerra do Ultramar
(Comandos – Angola), antes de vir para Lisboa. A sua mãe nasceu em Kinshasa (no
antigo Zaire), ainda nos tempos de Mobutu Sese Seko; foi criada desde os 5 anos
em Trás-os-Montes; fez o colégio em Lamego, mais tarde estudou nas Belas-Artes
do Porto. Conheceu o seu pai em Angola, após ter feito o Magistério Primário,
no seu regresso a África. A vinda de seus pais para Lisboa, deu-se no
tumultuoso período de 75.
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