segunda-feira, 22 de dezembro de 2025

O ÚLTIMO REFÚGIO, de MBARRETO CONDADO


Naquele edifício abandonado, onde a madeira apodrecida rangia ao vento e as paredes gastas guardavam silenciosamente memórias de outros tempos, uma pomba repousava sobre um amontoado de telhas partidas. Era ali que, em dias outrora mais leves, encontrara abrigo. Um ninho improvisado entre ruínas, um pequeno gesto de vida num lugar há muito entregue ao abandono.

Agora, porém, a ave permanecia imóvel, encolhida contra o frio e contra o destino. O que fora o seu refúgio começava a transformar-se no seu derradeiro leito. As telhas que antes protegiam tornavam-se, lentamente, o seu caixão de barro e silêncio. A luz que atravessava as frestas iluminava-lhe as penas baças, como um último afago, enquanto o mundo lá fora continuava indiferente.

Ali, no meio do que restava de uma casa e de uma vida, a pomba rendia-se. Não com revolta, mas com a serenidade triste de quem sabe que tudo tem um fim — até o mais persistente dos voadores. E assim, o ninho que a acolheu tornou-se o lugar onde a vida repousa pela última vez, numa despedida tão discreta quanto a própria existência da ave.

MBarreto Condado

 

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