sexta-feira, 1 de maio de 2020

A CORTE DAS TREVAS, de Anita Dos Santos















A Corte das Trevas, devido à forma como foi criada, não tinha um lugar próprio, um sítio seu. Ela existia onde o seu Senhor se encontrasse, e quem quer que ele chamasse à sua presença não podia escusar-se.
Após a partida da Rubra em busca de crias para si, o Senhor das Trevas saiu da gruta da pedreira e dirigiu-se para a orla da mata.
- Espinho! – Chamou uma só vez, em voz baixa, mas clara.
Durante uns momentos nada se ouviu. Depois, muito tenuemente começou a ouvir-se como que um restolhar, um arrastar de ramos secos, que fez com que os cantos da boca do Negro se elevassem ligeiramente.
No canto mais afastado da clareira que ficava à entrada da gruta, houve um movimento por entre os arbustos altos, que iam secando à medida que este mesmo movimento acontecia, até que, por fim, ficou à vista uma figura bastante alta e delgada, todo ele castanho nos seus vários tons. Ao parar de encontro aos arbustos agora secos, a sua figura passava despercebida.
À medida que foi avançando, via-se que as suas feições já haviam sido belas, mas agora assemelhava-se a algo velho, como um pergaminho de pele já muito usado e desgastado pelo tempo. Os seus cabelos eram cor de areia e os olhos eram negros como carvão.
- Viva! Há muito que não ouvia uma chamada tua, meu Senhor! – Saudou a figura emergente das moitas.
- Tu, pelo menos, respondes, quando chamado. – Respondeu o Negro.
- É esse o nosso dever para com o Soberano das Trevas. – Disse, fazendo uma vénia em frente do seu Senhor. – É um prazer voltar a ver-te e a servir-te.
- Espero bem que sim. – A voz do Senhor das Trevas era melíflua e arrastada, enquanto caminhava em torno do seu súbdito.
- Tenho trabalho para ti, Espinho. Quero que te infiltres na Cidade do Norte e que vejas por onde anda e o que faz aquele que se intitula druida Freixo. – O tom de comando que tinha empregado na ordem depois alterou-se, nunca tirando os olhos do Espinho e deixando bem claras as suas ordens.
- Ele é diferente dos outros humanos, por isso não te deixes enganar. É muito mais perigoso do que possas imaginar, se tiver ocasião para isso, mata-te. Quero saber tudo quanto faz, onde vai, com quem fala. Não te deixes ver por ninguém, em especial pelo Freixo, pois ele pode reconhecer-te. Isto é uma ordem!
» Se ouvires ou vires algo sobre os outros druidas, também quero saber, mas o teu alvo é o Freixo!
- Assim será meu Senhor. – Uma vez mais, o Espinho fez uma vénia ao Senhor das Trevas, e partiu por onde veio.

Anita Dos Santos

In “Crónicas de André e Vicente – A Cidade das Brumas”

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