sexta-feira, 17 de julho de 2020

CRÓNICA | TODOS AO TRABALHO, de Anita Dos Santos


Texto: Anita dos Santos
Foto da Autora: D.R.

- E eu já disse que era “pra” irmos todos ao trabalho! – O Bosques tremia de impaciência.
- Pois então, digam-me lá como é que vocês fazem para as plantas crescerem. – Perguntou o Vicente encarando Ervilha de Cheiro que era quem se encontrava mais próximo de si.
Este baixou a cabeça, entristecido antes de dar a resposta à questão que lhe fora colocada directamente, e indirectamente a todos os outros.
- Sabes, cada dia se torna mais difícil, porque para que as plantas, as flores ou as árvores cresçam, elas têm de nos ouvir falar com elas, têm de escutar na raiz, nas folhas tudo quanto lhes transmitimos, têm de sentir o nosso amor. Cada dia é mais difícil de conseguir.
Mais uma vez, baixou a cabeça com a voz embargada sem conseguir continuar a falar.
- Só que nós estamos a perder a faculdade de comunicar quer com as plantas quer com os animais. – Desta feita foi o Cotovia a falar. – Eu cada dia tenho mais dificuldade em me fazer entender com voadores, essa é que é a verdade. E no dia em que deixarmos de comunicar totalmente, é o dia em que aquele desgraçado nos venceu.
- Pois, mas isso é que não vai suceder! – Exclama o André. – Porque não vamos deixar, não é assim?
- E eu pergunto-me se vocês sabem como havemos de fazer para sermos entendidos de novo.
O Bosques assentava o olho direito nos dois jovens, enquanto o esquerdo vigiava os pequenos feéricos.
- Temos algumas ideias que acho devemos pôr em prática. – Responde o André esfregando as mãos.
- Desde que não implique cozer ninguém numa panela… - Com um ar descrente o Traquinas, de sobrolhos erguidos, deu uma volta sobre si mesmo.
- Isso agora depende. Se fores tu a ir para dentro da panela… Até que estou de acordo! – E com esta tirada o Cardo tirou a vontade de brincar ao Traquinas, que o encarou com uma carranca.
Desmancharam-se todos a rir, como era de esperar, e a brincadeira e confusão ficou instalada, até que o Vicente soltou um assobio estridente que fez com que as atenções se centrassem nele.

In “Crónicas de André e Vicente – O Bosque dos Murmúrios”

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