quarta-feira, 4 de agosto de 2021

CRÍTICA LITERÁRIA | O Diário Secreto de Laura Palmer, de Jennifer Lynch | SUMA DE LETRAS - Grupo Penguin Random House


 Texto: Isabel de Almeida | Jornalista | Crítica Literária

 Foto: D.R.


O Diário Secreto de Laura Palmer, de Jennifer Lynch surge agora em Portugal numa nova edição com  prefácio dos Co-criadores da famosa série televisiva de culto Twin Peaks, Mark Frost e David Lynch, com chancela Suma de Letras e com o selo dedicado pela editora a obras primas da literatura policial, de mistério e do género thriller.


Os fãs de Twin Peaks vão, certamente, adorar esta nova edição, e os que ainda não conhecem a série têm aqui a oportunidade de ouro para entrar neste mundo misterioso e surreal, surgindo o livro como uma perfeita extensão da narrativa, e revelando aos leitores os mais íntimos e sórdidos segredos de Laura Palmer, uma jovem  adolescente residente numa pequena cidade nos Estados Unidos da América que viria a intrigar o FBI ao aparecer morta com apenas 16 anos.


Este livro, escrito na primeira pessoa, como se de um verdadeiro auto-relato se tratasse revela-nos a outra face de uma rapariga que quase todos julgam inocente, mas que revela, desde os seus 12 anos um precoce desenvolvimento sexual, sendo impulsiva, e desafiando as regras sempre que tal lhe é possível.


Laura está longe de ser a menina inocente que muitos julgam, mas a sua morte levanta o véu sobre o seu verdadeiro eu, e o mesmo sucede com este diário. 


Nestas páginas percorremos parte do crescimento de Laura, e vemos que a jovem foi vítima de abuso sexual. Há uma personagem referida no Diário como abusador - BOB - que nos deixa a dúvida se se trata de uma referência à pessoa física que verdadeiramente cometeu os abusos, ou se é uma criação da fantasia e mesmo do subconsciente de Laura.


Numa prosa intensa, bastante gráfica e violenta e com os traços surrealistas que encontramos no trabalho do pai enquanto realizador, Jennifer Lynch dá-nos uma caracterização muito cruel mas, também muito realista de Laura Palmer, podendo mesmo considerar-se que a protagonista da trama apresenta traços de personalidade borderline, na medida em que incorre por sistema em comportamentos de alto risco (promiscuidade sexual, consumo de drogas, pornografia e prostituição) como tentativa de afirmação de uma identidade que não sabe como construir.


Se é certo que muitos comportamentos de Laura podem chocar o leitor, também é real a compaixão que a personagem suscita, na medida em que encontramos uma adolescente em profundo sofrimento psicológico, que não é feliz, e que se sentiu perdida e muito só, mesmo vivendo com os pais e contando com o apoio da melhor amiga (Donna).


Nem sempre é fácil seguir o ritmo da escrita da autora, sendo também , por vezes, difícil distinguir o que é real daquilo que é imaginado ou fantasiado por Laura Palmer. Mas essas dúvidas e mesmo as falhas de lógica  no discurso intimista do diário acabam por ser uma forma interessante, encontrada pela esscritora, de nos apresentar uma personagem  muito perturbada mentalmente como se nos revela Laura Palmer. Um livro que nos faz querer revisitar uma série de culto ou descobrir o seu universo em primeira mão, sendo já um clássico.

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